sábado, 30 de maio de 2009

Recordação

Agora, o cheiro áspero das flores
Leva-me os olhos por dentro de suas pétalas.
Eram assim teus cabelos;
Tuas pestanas eram assim, finas e curvas.
As pedras limosas, por onde a tarde ia aderindo,
Tinham a mesma exalação de água secreta,
De talos molhados de pólen,
De sepulcro e de ressurreição.
E as borboletas sem voz
Dançavam assim veludosamente.
Restitui-te na minha memória, por dentro das flores.
Deixa virem teus olhos, como besouro de Ônix,
Tua boca de malmequer orvalhado.
E aquelas tuas mãos dos inconsoláveis mistérios
Com suas estrelas e cruzes,
E muitas coisas tão estranhamente escritas
Nas suas nervuras nítidas de folha,
- e incompreensíveis, incompreensíveis.

Cecília Meireles

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